![]() | Por: Fernando Conceição 03/05/2013 |
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Legenda:Imagem da capa de The Economist | ||
A
edição da semana passada (27/04 a 3 de abril 2013) da mais influente
revista de informação semanal do planeta, The Economist, trouxe na capa,
no principal editorial, em três matérias (4 páginas) e uma resenha
crítica de mais meia página, sua declaração de guerra pela extinção das
políticas de ação afirmativa. Recebo o exemplar impresso em casa, toda
terça ou quarta seguinte.
“Cotistas têm pior resultado entre universitários” foi, por sua vez, a manchete da Folha de S. Paulo no domingo, 28/04, em que aquela The Economist circulava. O texto da revista inglesa é doutrinário, na linha, digamos, de Adam Smith. A reportagem da Folha é planfletária. A pesquisa de Márcia de Carvalho e Fábio Waltenberg (Universidade Federal Fluminense), tomada como fonte para a matéria, não conclui pelo viés do matutino paulista. Como já sugerido por outrem, a manchete do jornal poderia ser “Cotistas superam não-cotistas em formatura universitária”. Sua campanha contra as cotas já dura uma década e meia, apesar de na mídia mainstream ser o veículo que melhor cobre o tema (Conceição, 2005). A própria Folha, em editorial na terça (“Cotas e notas”, 30/04/13), reconheceu, sem explicitamente admitir, que os dados até aqui são favoráveis à continuidade, melhoramento e correção de rumos das políticas de cotas nas universidades brasileiras. Isso porque, a diferença de notas e pontuação nos testes do Enade entre cotistas e não-cotistas está dentro da faixa de controle. É, em média, de pouco mais de 9%. Historicamente, o desempenho de estudantes mulheres tem sido 10% superior ao de universitários do sexo masculino. E no tocante à evasão escolar, não-cotistas abandonam os cursos sem se formar numa média acima de 10% dos cotistas. Os agentes políticos do Brasil, país que, diferentemente dos Estados Unidos da América, da Índia ou da Malásia (ao lado da África do Sul, escrutinados no material de The Economist), somente há dez anos experimenta a implantação de tais políticas, precisam fortalecer, com mais recursos e qualificação, as ações afirmativas. Não indefinidamente. Uma coisa, porém, é certa: é cedo para retroceder nessa agenda. Nos Estados Unidos ela existe há meio século e na Índia, desde 1949. VISÃO DE WALL STREET O debate no Brasil é de meados dos anos 90. Em julho ou agosto de 1996 – tenho o recorte do jornal em alguma pasta dos meus arquivos bagunçados – o diário de maior circulação dos Estados Unidos da América, The Wall Street Journal (WSJ), mandou o seu correspondente gringo na América do Sul se deslocar até a Universidade de São Paulo para uma única tarefa. WSJ é focado em negócios e economia, um dos mais importantes do mundo, editado desde 1889 pela empresa Dow Jones & Company. Em 2007 foi agressivamente adquirido, num lance na bolsa de valores de Wall Street (Nova York), pelo magnata da News Corporation, Rupert Murdoch. Em 1996 o correspondente foi pautado para entrevistar os integrantes do Comitê Pró-Cotas para Negros da USP. Entrevistou também ministros do governo Fernando Henrique Cardoso (que iniciou cotas em órgãos públicos e no Itamaraty), analistas e demais.Em síntese o artigo do WSJ, publicado na primeira página, dizia que o ambiente de crescimento econômico dava espaço ao debate das ações afirmativas. Por que o Comitê Pró-Cotas na USP serviu de fonte? Porque à época era o único grupo de ativistas sociais brasileiros que agiam pela implantação no Brasil de políticas compensatórias de ação afirmativa, a partir da universidade. Único e pioneiro, o Comitê era composto por um punhado de estudantes de dentro e de fora da USP, com apoio de dois ou três docentes. Entre os quais o diretor da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, professor Antonio Junqueira de Azevedo (1939-2009). Lembro dele, de tradicional família aristocrática, abrindo os jardins de sua mansão no luxuoso bairro do Morumbi, para abrigar o grupo nas reuniões periódicas de planejamento das ações. As quais radicalizamos entre 1995 e 1996, levando o reitor da USP, Flávio Fava de Moraes, a radicalizar-se em resposta: pessoalmente fui detido no domingo de Páscoa de 96. Preso no distrito policial, somente fui liberado por volta da meia-noite, quando, acompanhado da esposa em seu carro, Paulo Sérgio Pinheiro(foto), atual presidente da Comissão Nacional da Verdade, foi à delegacia pagar minha fiança. Fava ordenou minha incriminação e fui ameaçado de expulsão do curso de doutorado que cumpria na Escola de Comunicações e Artes. Cuja congregação saiu em minha defesa, assim como o sindicato dos professores, o sincato dos trabalhadores etc. Milton Santos (1926-2001), Kabengele Munanga, Jair Borin (1942-2003), Solange Couceiro e Thomas Skidmore organizaram no Clube dos Professores da USP um almoço em desagravo, diante da ameça da Reitoria -que, por fim, desistiu dos dois processos – o penal e o administrativo. Minha homenagem aos colegas estudantes da época – Kelly, Newman, Mauro, Susana, Big Richard, Amarildo – e à advogada Maria da Penha, coordenadora à época da OAB/SP. Pioneiros na defesa das cotas no Brasil, foram chutados de cabo a rabo. Não apenas pelos que desde sempre estiveram do lado de lá, como o pessoal da Folha. Nossos maiores opositores foram a antiga militância negra e seus protointelectuais ditos da “esquerda”, fiéis a partidos e igrejas políticas. Hoje, vitorioso aquele projeto, a causa é abraçada por quase todos – resultando na ira dos reacionários perdedores e no bom-mocismo dos oportunistas de plantão. |
O presente blog tem por objetivo o compartilhamento de materiais pedagógicos que auxiliem no combate a todos os tipos de violência e discriminação presentes no contexto escolar do Recanto das Emas/DF, proporcionando a instrumentalização de Coordenadores Pedagógicos e Professores.
terça-feira, 7 de maio de 2013
Brazil, cotas e chorumelas: breve histórico
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