O Brasil
está passando pelo seu período mais longevo de democracia. Contando
desde a posse do primeiro presidente civil após a ditadura militar e a
instalação da Assembléia Nacional Constituinte, em 1985, são 28 anos de
vigência do sistema democrático, seis eleições presidenciais
consecutivas, funcionamento regular dos poderes, entre outros.
Um texto de 1988 do pensador argentino radicado no México Nestor García Canclini, intitulado Culturas transnacionales y culturas populares
(publicado pela IPAL, de Lima) coloca em certo momento que as
expressões culturais das classes populares ganham visibilidade a medida
que se institucionalizam os regimes democráticos na América Latina.
Isto acontece porque as repúblicas latino-americanas, entre elas a
brasileira, se consolidam pari-passu a vigência de estruturas
patrimonialistas herdadas do período colonial. As classes hegemônicas
destas nações, articuladas com o grande capital transnacional, procuram
manter sob rédea curta as aspirações sociais, políticas e culturais das
classes subalternas. Por isto, as democracias nestes países são
inconstantes e instáveis – funcionam até o momento em que a visibilidade
e ascensão sócio-política das classes subalternas colocam em risco a
hegemonia das classes dominantes nacionais e os interesses do capital
transnacional.
O que se percebe, de forma inconteste, é que nestes 28 anos de
vigência da democracia brasileira, é um avanço significativo da
visibilidade das lutas dos movimentos sociais, entre eles, o movimento
anti-racista. Como a tendência ao autoritarismo e/ou a restrição a
processos democráticos por parte das classes dominantes sempre é
justificado por argumentos que desqualificam as classes subalternas, o
preconceito e o racismo sempre emergem em situações de conflito.
Percebe-se isto nas análises que tratam de líderes que saíram das
classes subalternas, como Lula (Brasil), Chavez (Venezuela) e Evo
Morales (Bolívia).
Mas também observamos isto com a bandeira das cotas nas universidades
(negros e pobres não têm condições de frequentar os cursos das
universidades de excelência e, portanto, devem ter o acesso interditado
ou dificultado) e a aprovação dos direitos trabalhistas dos
trabalhadores e trabalhadoras domésticos.
Há ainda outro ingrediente nesta conjuntura. O desmonte do Estado
proposto pela ideologia neoliberal (em crise, mas ainda vigente em
certos partidos conservadores) concentra o exercício das funções do
poder de Estado na chamada “segurança pública”. Não é a toa que os
discursos conservadores dão prioridade a ações repressivas (veja o caso
do governo estadual de São Paulo que pratica uma política de repressão
nas periferias). Na visão conservadora, o papel do Estado se resume
única e exclusivamente na repressão aos povos da periferia, como forma
de contenção. O discurso do medo disseminado pela mídia hegemônica dá
sustentação a isto.
Implantação de cotas e ações afirmativas para negros, negras,
indígenas, pessoas da periferia, ampliação e aperfeiçoamento das
políticas públicas em todas as áreas, defesa do Estado de bem estar
social e liberdade plena de expressão dos movimentos sociais são ações
de defesa da verdadeira democracia. Coisa que uma classe dominante
patrimonialista não quer nem ouvir falar.
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